Em 1872 , o matemático alemão Richard Dedekind
publicou uma obra intitulada Continuidade e Números Irracionais, dedicado ao estudo do
problema:
Todo o ponto da recta produz nela um corte.
E sempre que se considere um corte na recta –
repartição em duas classes (A) e (B) que satisfaçam as condições:
1ª - nenhum ponto escapa à repartição
2ª - todo o ponto da classe (A) está à esquerda
de todo o ponto da classe (B) - haverá sempre um ponto P que produza o corte, isto é que
separe as duas classes?
Nessa obra encontra-se pela primeira vez um
tratamento rigoroso do conceito de continuidade e a resposta à pergunta acima. Vejamos
como Dedekind põe a questão: "... nós atribuímos à recta a qualidade de ser
completa, sem lacunas, ou seja, contínua,. Mas esta continuidade, em que consiste? A
resposta a esta pergunta deve compreender em si tudo, e somente ela permitirá desenvolver
em bases científicas o estudo de todos os campos contínuos. Naturalmente, não se
consegue nada quando, para explicar a continuidade, se fala, dum modo vago, de uma
conexão ininterrupta nas suas partes mais pequenas; o que se procura é formular uma
propriedade característica e precisa de continuidade que possa servir de base a
deduções verdadeiras e próprias.
Pensei nisso sem resultado por muito tempo mas,
finalmente achei o que procurava. O meu resultado será talvez julgado, por várias
pessoas, de vários modos mas a maior parte, creio, será concorde em considerá-la
bastante banal. Consiste ele na consideração seguinte:
Verificou-se que todo o ponto da recta determina uma
decomposição da mesma em duas partes, de tal natureza que todo o ponto de uma delas
está à esquerda de todo o ponto da outra. Ora, eu vejo a essência da continuidade na
inversão desta propriedade e, portanto, no princípio seguinte: « se uma repartição de
todos os pontos da recta em duas classes é de tal natureza que
todo o ponto de uma das classes está à esquerda de todo o ponto da outra, então existe
um e um só ponto pelo qual é produzida esta repartição de todos os pontos em duas
classes, ou esta decomposição da recta em duas partes».
Como já disse, creio não errar admitindo que toda
a gente reconhecerá imediatamente a exactidão do princípio enunciado. A maior parte dos
meus leitores terá uma grande desilusão ao aprender que é esta banalidade que deve
revelar o mistério da continuidade. A este propósito observo o que segue. Que cada um
ache o princípio enunciado tão evidente e tão concordante com a sua própria
representação da recta, isso satisfaz-me ao máximo grau, porque nem a mim nem a
ninguém é possível dar deste princípio uma demonstração qualquer. A propriedade da
recta expressa por este princípio não é mais que um axioma, e é sob a forma deste
axioma que nós pensamos a continuidade da recta, que reconhecemos à recta a sua
continuidade».
Em resumo Dedekind caracteriza a continuidade da
recta por esta afirmação que é designada por axioma ou postulado da continuidade de
Dedekind – todo o corte da recta é produzido por um e um só ponto dela, isto é
qualquer que seja o corte (A,B) existe sempre um ponto da recta que separa as duas classes
(A) e (B).
Quase na mesma altura o matemático alemão G.Cantor
formulou a caracterização da continuidade de uma maneira semelhante, por isso a este
enunciado se chama, com maior propriedade, axioma da continuidade Dedekind-Cantor.
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